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terça-feira, 12 de janeiro de 2010

“A Cidade e a Identidade”

A cidade não é apenas uma estrutura física, ela é um produto da evolução histórica um signo de vivências, um conjunto estruturado de bairros e ruas com vida própria, produto de um conjunto de vivências de cidadãos que ao longo do tempo a criaram e a transformaram é por isso um museu vivo, retrato da Memória Colectiva que transmite um sentimento de pertença cultural, onde cada rua e cada bairro tem a sua história.

Georg Simmel em “A Metrópole e o Espírito da Vida” (1903) retrata a cidade grande e o constante fluxo migratório de pessoas vindas do interior para a cidade, para tentar uma vida melhor. Para Henry Lefevre, filosofo marxista e sociólogo francês e um do dos fundadores da teoria urbana no seu texto “O Direito à Cidade” (1901), Lefevre parte da ideia de que o capitalismo produziu novas formas urbanas, uma cidade capitalizada e controlada.

O Barreiro durante décadas foi, também, uma cidade supostamente controlada, primeiro pela exploração capitalista emergente da revolução industrial e depois através da politica repressiva da ditadura.
A cidade em si não gera contradições sociais, ou seja, elas existem reflexo dos interesses individuais ou colectivos. Mas foi no seio das cidades que se processaram as grandes transformações sociais do século XX.
A história recente, do Barreiro, é plena de episódios e factos de cabal importância, quer para a história local, quer para a história de Portugal. Sendo a cidade que me acolheu, pela vivência e convivência continuada, posso afirmar que o Barreiro é exemplo de grandes transformações sociais, no associativismo, na cultura e no desenvolvimento.
A cidade foi criando a sua identidade, fundamentada na interculturalidade, de diferentes histórias de vida de gentes vindas de muitos sítios, num quotidiano, ainda que marcado pelas diferenças, mas com um objectivo comum, marcado pela vontade de construir uma terra de todos e para todos.
Esta postura, esta marca de identidade que ainda hoje prevalece, surgiu em grande parte com a implantação do Caminho de Ferro que redesenhou a antiga vila ribeirinha com os traços característicos dos operários e respectivas famílias, oriundos, sobretudo, do Sul do país. Foram ficando e deixando os exemplos do seu trabalho e da sua cultura, hoje tão vincadamente marcantes na sua postura social. Assim o Barreiro cresceu por dentro e para fora.
Com o Caminho de Ferro, reassumiu o seu papel na História de Portugal, anteriormente (sec. XV) referenciado põe Álvaro Velho do Barreiro, cronista da viagem que levou Vasco da Gama à Índia
O Comboio está na génese da transformação de uma pequena Vila (Carta de Foral de 16/01/1512 – D. Manuel I) de pescadores e salineiros, numa cidade ligada à revolução industrial que se processou em finais do século XIX. A chegada do Caminho de Ferro, em 1859, veio potenciar o seu crescimento urbano e demográfico.
Ainda que, oficialmente, a inauguração da linha do Sul tenha acontecido no ano de 1861, a relação do Barreiro com o Comboio e a certeza de que essa importante via de comunicação viria a ser o ponto de partida para a grande transformação da pequena Vila na Cidade industrial que, durante um século, foi um dos pólos produtivos mais importantes do país, aconteceu de facto em 1859, no dia dois de Fevereiro, quando Sua Majestade o Rei D. Pedro V, acompanhado de sua família e altas figuras da Nação foram recebidos festivamente no Barreiro. O objecto dessa visita foi a semente que deu origem à cidade industrial, que viria a ser. Foi a primeira viagem de comboio, oficialmente designada e noticiada, com partida do Barreiro e chegada a Vendas Novas.
Em 1875 instalaram-se as primeiras fábricas, ligadas à indústria de transformação de cortiça, vinda do Alentejo e com a cortiça vieram os homens e mulheres, na busca de uma vida melhor.
Mais tarde, em 1908, a Companhia União Fabril começa a instalar o seu núcleo central de fábricas e, à volta destas, vão-se construindo novos bairros, necessários ao alojamento dos imigrantes vindos de todo o país, sendo na sua maioria do Alentejo e Algarve, que ali procuravam o seu sustento.
De tal modo se desenvolveu o Barreiro que, em 28 de Junho de 1984, foi elevado à categoria de Cidade, exactamente num período em que, demográficamente, apresentava sintomas de estagnação, em grande parte devido ao encerramento da maioria das unidades produtivas. Em consequência disso , adveio o desemprego, a procura de trabalho noutros lugares e assim, em termos quantitativos, aumentaram as migrações pendulares e muitos residentes emigraram para outras paragens. Hoje, a cidade que foi signo de progresso material, pelas suas características de cidade industrial, inserida principal área metropolitana do país, o seu património material e museológico é rico quanto a arqueologia industrial e guarda, fundamentalmente, uma Memória Colectiva muito rica.
O Barreiro é cidade há um quarto de século, já passou por crises piores do que esta, sabe o é repressão e como resistir e é com os homens e mulheres que amam a sua cidade que, paulatinamente, vai desbravando os caminhos para um futuro melhor.

ARFER

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